13/07/2018

Não há duas sem três (agulhas)

Este pretende ser um texto com algum humor (ainda que um pouco negro ou amarelo), a pedido da Chic'Ana.

Gosto de costurar, bordar, fazer tricot e crochet – são algumas das minhas habilidades (algumas outras linhas em que também me escrevo, como costumo dizer). E faço-o em horas de lazer; matando tempos já de si mortos, ou fazendo-os reviver; cuidando com carinho do vício das agulhas instalado, até em horas em que o não deveria ser. Um fado. No quarto (des)arrumado; à lareira na cozinha; no sofá da sala; em frente ao computador; em salas de espera; em espera dentro do automóvel; na praia… uma dor! 

E por vezes, num repente, num levanta e senta, num senta e levanta, são agulhas que desaparecem misteriosamente… onde é que está a agulha suplementar? Ainda há pouco a tive na mão! E reviro tudo: a toalha da mesa, os papéis à volta do computador, as gavetas da máquina de costura, o sofá, o estrado e o enxergão, se preciso for; e de agulha nada, sumiu, o estupor! 

Tem de haver sempre uma outra à mão, não vá o trabalho ficar parado, e o vício estragado. Até que chega uma altura em que elas têm de aparecer. Se não estão em lado nenhum, em algum lugar têm de estar, nem que o sítio mais óbvio tenha de ser outra vez batido, revirado, ou até descosido, desforrado, ou todo desmantelado, agora é que vai ser! E viro o sofá de novo de pernas para o ar, e nada! E volta ao seu lugar. Espera! ouvi qualquer coisa a tinir… e pimba deixa cá ver: torna a virar, agora com mais força, e cai uma moeda de um cêntimo, já ganhei o dia! E por uma fresta de lado enfio a mão, pode ser que encontre outro tostão, ah, ah! Achei a danada, mas não a consigo tirar. Vou buscar uma agulha mais grossa com farpa para a puxar. Consegui! Onde está uma tem de estar a outra!... E mexe, remexe, sacode, “se encosta, se enrosca, se abre, se mostra para mim, me agarra, me morde, me arranha”, me pica, cá estás tu, minha sacana! E vão duas, ufa! “Quem é vivo sempre aparece”, diz o povo, e também: “não há duas sem três”. 

E “às três é de vez”: quando na praia se deixa uma agulha de crochet, em cima da toalha, no trabalho que se está a fazer. Vais dar um mergulho, voltas e sentas-te na toalha. Aaaaaaaaaaiiiiiiiiiiiiii! Espetas a agulha com farpa na nádega. 
– Marido, puxa aqui a agulha! 
O marido, a ficar branco: 
– Como? Isto tem uma farpa, não sai, pode sair carne agarrada, ou algum nervo... não sou capaz! 
– Ai não? deixa cá ver... 
E eu, a quente e a frio, zás! 

Um acto de repentina coragem, que nos valeu uma saída da praia, mais cedo do que o previsto, para ir fazer o curativo. 

Moral da história: Não te preocupes, com as agulha(da)s. Haverá sempre alguma à solta que te espreita em qualquer buraco!

14 comentários:

  1. Humor não lhe falta e bem escrito! Gostei !

    Bjinhos Bfs

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  2. Excelente! O espírito de humos é uma forma de inteligência. Adorei o texto. Lembrei a minha mãe que estava sempre a tricotar… Só não sei se perdia as agulhas…
    Uma boa semana.
    Um beijo.

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  3. Olá, Fá (és Fá ou Fé)? És as duas coisas, uma és, outra, tens-rs!

    Apreciei imenso o teu texto, quer pela semântica (felizmente k não tenho esse vício. "Tás" a ver o desatino, que seria? Estou isenta de Artes Manuais), quer pela morfologia e sintaxe do mesmo. Sabes escrever, é o k é.

    Gostei mto deste louco cirandar teu e das agulhas, perdidas, não sei se contigo ou se tu com elas. E nem a canção do Marco Paulo, "Taras e manias", aqui faltou.

    O teu marido já dizia mal à sua vida e estava já a ver-se numa possível cirurgia (rs) para remoção das agulhas, e logo naquele sítio. Os homens são uns meninos grandes -rs.

    Beijinhos e dias felizes.

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  4. Não conhecia este blogue.
    Um texto cheio de humor que gostei de ler.
    Abraço

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  5. Adorei o texto, Fá!...
    Ai se me pedissem para puxar a agulha... acho, que reagiria da mesma maneira... ficaria branca... e provavelmente... ainda seria a Fá que me teria de arrastar inanimada para sair da praia... com agulha ou sem agulha... :-))
    Eu até para fazer uma análise ao sangue... não garanto, se chego acordada ao fim da mesma... :-P
    Deve ser trauma... de outras vidas...
    Mais um cantinho que adorei descobrir!... E também eu estou devendo uma história à Chicana... :-P Mas o tempo, não tem deixado... a ver se o faço agora nas férias...
    Beijinhos para ambas!
    Ana

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  6. Uma pessoa distraída perde tudo. Mas uma pessoa persistente vai encontrando quase tudo o que perde...
    Um texto delicioso e divertido. Parabéns.
    Não conhecia este teu "arquivo meio morto" cheio de vida. Obrigado por teres deixado link no teu silêncio...
    Beijo, querida amiga Fá.

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  7. Texto delicioso e muito agradável de ler; tem o fio que as agulhas irão tecer.

    Beijo
    SOL

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  8. Leitura ótima, fluiu deliciosamente e gostei do bom humor! beijos, lindo fim de semana! chica

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  9. Que leitura agradável e divertida :) Beijinhos

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  10. Um texto delicioso de ler Fá, adorei o humor. Parabéns pelos blog. Todos seus blogs são excelente.

    Uma excelente semana, e um mês de setembro cheio de coisas boas.
    Um abraço!
    Escrevinhados da Vida

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  11. Obrigada pela visita.
    (florbytes)
    Gostei desta trapalhada de agulhas perdidas. Queremos fazer tudo ao mesmo tempo. Acabamos perdendo tempo com tamanha ansiedade.
    Não temos jeito :-)

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  12. Um texto brilhante e graças ao bom humor muito divertido de ler.
    Bjos

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  13. Um tanto arrepiante para mim... kkk...kkk...

    Beijinho.
    ~~~~

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  14. :) gostei e até me revi nesta " estoria "
    também tenho jeito para croché e outras coisas de agulha e linha.
    Acidentes também...já fui para o hospital com uma agulha de croché metida dentro de um ouvido :)
    lá está, coisas que só acontecem a quem tem mania pelas agulhas e linhas:)
    Saio daqui a sorrir e a esperar que neste caso nao haja mais outra vez
    Abraço e brisas doces *

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«Em cada um de nós há um segredo, uma paisagem interior com planícies invioláveis, vales de silêncio e paraísos secretos.»
(Antoine de Saint-Exupéry)
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